A presidência portuguesa da União Europeia e a relação com o Médio Oriente – em busca de uma oportunidade perdida?

Médio Oriente, uma região carregada de história; berço das principais religiões; terra de contrastes, onde a opulência, as desigualdades e as ameaças aos Direitos Humanos convivem num permanente desafio à consciência do Homem, e onde a luxúria e a gula, a par de outros pecados capitais, marcam a agenda dos poderosos. O Médio Oriente é uma região com um longo registo de instabilidade, num continuado ambiente de convulsão social, de guerras civis e ameaças à segurança regional e internacional. O envolvimento das grandes potências mundiais e a interferência de importantes actores não-estatais é crescente[i], pondo frequentemente em causa as mais optimistas perspectivas de coesão e justiça social. Consequência directa dos graves problemas sociais e económicos que, desde há muito, abalam aquelas sociedades são os amplos movimentos de contestação popular que têm vido a alastrar-se por grande parte dos Estados da região. A crueldade dos números, por muitos aparentemente ignorada, não esconde uma realidade: o Médio Oriente é, no decurso das três últimas décadas, a região com os índices mais elevados de desigualdade a nível planetário[ii]. O fenómeno terrorista, representado por organizações como a Al Qaeda e o DAESH é, também ele, produto dos muitos problemas da região, acentuados pela ausência de uma verdadeira ordem unificadora e moderadora das políticas seguidas pelas lideranças nacionais, resultando num sério desafio à ordem regional e internacional[iii]. À tumultuosa situação instalada na região, juntou-se, agora, uma nova crise – o COVID-19 -, afectando não somente a segurança das suas populações, como a dos Estados vizinhos, potenciando múltiplas iniciativas agressoras representadas por actores estatais e não-estatais. Esta clara exposição às crescentes ameaças à sua segurança parece ter despertado, finalmente, os Estados da margem norte do Mediterrâneo, com natural destaque para os Estados-Membros da União Europeia (UE), para a inadiável reconfiguração da sua política externa, que contemple um inequívoco envolvimento nos assuntos daquela problemática região. No âmbito da actual presidência da UE, espera-se de Portugal o seu real contributo para este enorme e ambicioso desafio, que é o da estabilidade internacional; no caso em apreço da região do Médio Oriente.

Artigo de opinião do Doutor João Henriques, publicado no jornal i, a 22 de Fevereiro de 2021