*** Por José Sousa Dias, da agência Lusa ***
O vice-presidente do Observatório do Mundo Islâmico (OMI) defendeu em declarações à agência Lusa que as presidenciais de sexta-feira no Irão não deverão trazer mudanças significativas, com candidatos maioritariamente conservadores e da linha dura.
João Henriques lembrou que o Conselho dos Guardiães, que avalia os candidatos, aprovou seis nomes, na sua maioria, conservadores, para substituir o falecido Presidente Ibrahim Raisi, que pereceu num acidente de helicóptero a 19 de maio, precipitando as eleições presidenciais antecipadas.
“Os candidatos mais proeminentes incluem figuras conservadoras como Mohamed Bagher Khalifaf, Saeed Jalili e Mustafa Pormohamadi. Apenas um candidato reformista, Massoud Peseshkian, foi aprovado para concorrer. A exclusão de outras figuras reformistas e moderadas por parte do Conselho dos Guardiães é uma ocorrência comum nas eleições iranianas”, sustentou.
Para João Henriques, as eleições decorrem num período particularmente conturbado, marcado por permanentes tensões relacionadas com o programa nuclear iraniano e o envolvimento do país em conflitos regionais, temas que, no entanto, os candidatos não apresentaram pormenores sobre a forma como abordarão estas questões.
“No sistema político iraniano, o líder supremo detém muito mais poder do que o Presidente. Ele é o líder supremo que ocupa o cargo há 35 anos. Com o predomínio dos candidatos conservadores, a exclusão dos reformistas e o poder limitado da presidência, é pouco provável que as próximas eleições provoquem grandes mudanças ou alterações na política do Irão, que continuará a ser largamente determinada pelo líder supremo e pelo aparelho conservador”, explicou.
Para o analista, a morte de Raisi abrirá, eventualmente, a perspetiva de uma nova disputa pelo poder entre as fações conservadoras, “mas não é provável que altere fundamentalmente a orientação política do país e a hipótese de base é de que não haverá mudanças significativas a curto prazo”.
Sem menosprezar os restantes candidatos, João Henriques vê em Mohamed Bakher Khalibaf, de 62 anos, o que tem as melhores hipóteses de ganhar as presidenciais iranianas, pois obtém o consenso das duas forças mais poderosas do Irão, o gabinete do líder supremo e o corpo de guardas da Revolução Islâmica.
O alto responsável do OMI lembrou que, nas eleições legislativas de março de 2024, e considerando os números oficiais divulgados, a taxa de participação foi de apenas 41%, o que é muito baixo, tendo em conta o registo histórico eleitoral do Irão.
“Muitos iranianos estarão divididos quanto à possibilidade de as eleições abordarem questões económicas prementes e preocupações sociais, como as leis sobre o ‘hijab’ obrigatório. Alguns estão céticos quanto à possibilidade de as eleições conduzirem a uma mudança significativa, independentemente do resultado”, sublinhou.
“Na verdade, serão muitos os fatores que poderão contribuir para uma baixa participação popular, como o ceticismo quanto à capacidade dos candidatos para resolverem as dificuldades económicas e as questões sociais, a exclusão dos candidatos reformistas pelo Conselho dos Guardiões, a eliminação da confiança no processo eleitoral e a crença de que o líder supremo e os órgãos não eleitos constituírem, na verdade, o poder real”, explicou.
Para João Henriques, todos estes fatores instalam num cidadão comum a “perceção de que o resultado das eleições, seja ele qual for, não conduzirá a grandes mudanças no seu modo de vida”.
“O certo é que uma fraca afluência às urnas poderá comprometer ainda mais a legitimidade das eleições e a confiança da sociedade no sistema político. O líder supremo e as fações conservadoras acabarão por manter o controlo da política do Irão, seja qual for o nível de participação nestas eleições, numa altura em que a sua legitimidade política se encontra no nível mais baixo de sempre, devido às dificuldades económicas e aos movimentos de protesto que têm vindo a ter lugar por todo o território iraniano”, acrescentou.
Notícia publicada pela agência Lusa no dia 27 de junho de 2024