Lisboa, 30 jul 2024 (Lusa) – O vice-presidente do Observatório do Mundo Islâmico (OMI) defendeu hoje em declarações à agência Lusa que um eventual ataque israelita contra o Hezbollah em território libanês terá o potencial de desencadear uma escalada significativa do conflito na região.
João Henriques frisou que os mais recentes acontecimentos ocorridos nos Montes Golã, controlados por Israel, provocados por um ataque com ‘rockets’ no sábado que resultou na morte de pelo menos 12 crianças e adolescentes num campo de futebol improvisado em Majdal Shams, “pronunciam uma escalada significativa nas permanentes tensões entre Israel e o grupo xiita Hezbollah”.
O ataque foi, de imediato atribuído pelas forças de defesa de Israel ao Hezbollah, que, por sua vez, negou qualquer envolvimento, afirmando que não tinha relação com o incidente e que as acusações eram falsas, lembrou o analista português de política internacional, que pôs em causa a veracidade das acusações israelitas.
“Em resposta ao ataque, Israel já realizou retaliações, atingindo alvos do Hezbollah no sul do Líbano. O Hezbollah não justifica ataques contra civis israelitas. Na verdade, no caso específico do recente ataque aos Montes Golã, o grupo negou categoricamente qualquer envolvimento. O grupo geralmente afirma visar alvos militares, não civis”, argumentou João Henriques.
“Após o ataque de sábado, Israel apressou-se a declarar que as vítimas mortais eram israelitas, mas muitos dos drusos atacados não têm nacionalidade israelita e são cidadãos sírios. As crianças que foram mortas eram árabes, não israelitas. Além disso, os Montes Golã não são israelitas”, justificou.
Majdal Shams é uma localidade de maioria drusa nos Montes Golã, território sírio ocupado por Israel na sequência da Guerra dos Seis Dias, em 1967, e anexado em 1981. Os drusos são uma minoria árabe, não muçulmana, presente em vários países da região.
Segundo o responsável do OMI, Israel tomou os Montes Golã, mas as Nações Unidas não os reconhecem como pertença israelita, mas sim sírios.
“Portanto, Israel não tem qualquer justificação para a alegada autodefesa. O Hezbollah negou ter feito o ataque. Israel afirma que foi o Hezbollah. Talvez Israel o tenha feito por engano. Talvez o Hezbollah o tenha feito por engano. Certo é que o Hezbollah não ataca civis em Israel. Por que razão atacaria civis na Síria?”, interrogou.
Questionado sobre qual o papel que o Irão pode vir a desempenhar no pós-ataque nos Montes Golã, João Henriques sublinhou que se o Hezbollah for atacado “há o potencial efeito de desencadear uma escalada significativa do conflito na região”.
“Pode levar a uma resposta mais intensa do Irão e, possivelmente, envolvendo outros atores regionais como a Síria. Se a eventual retaliação israelita for demasiado forte, isso pode obrigar o Irão a atacar com maior intensidade. A situação é particularmente delicada, reconheça-se, já que Israel se encontra numa posição algo debilitada, precisando de responder para não parecer frágil perante outros inimigos regionais”, argumentou.
“Além disso, uma intensificação do conflito poderia arrastar outros países para a guerra, incluindo os Estados Unidos e isso tornaria a situação ainda mais perigosa e imprevisível. A Síria, por seu turno, sendo aliada do Irão e tendo já sofrido ataques israelitas no seu território, iria ser inevitavelmente envolvida no conflito”, acrescentou.
Instado a pronunciar-se sobre o que pode fazer a comunidade internacional para travar uma eventual escalada no conflito, João Henriques, insistindo nos receios de uma escalada militar, manifestou também preocupação de que uma intensificação do conflito possa arrastar outros países para a guerra, incluindo os Estados Unidos e o Irão.
“A decisão final sobre a forma e o momento da retaliação ainda não foi tomada e as discussões continuam no gabinete de guerra israelita. A possibilidade de uma guerra total entre Israel e Hezbollah não é apenas uma questão de conflito militar, mas também de consequências humanitárias imprevisíveis, políticas e sociais associadas”, referiu.
“A comunidade internacional, incluindo as Nações Unidas e países mediadores, terá um papel crucial na tentativa de evitar que a situação se deteriore ainda mais. No entanto, a eficácia desses esforços dependerá da disposição de todas as partes envolvidas e evitar a escalada da violência”, concluiu.
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